
Porto Velho, RO - A reunião de cúpula dos líderes do G7, encerrada nesta terça-feira na cidade canadense de Kananaskis, ocorreu sob o efeito da ofensiva israelense para tentar desmantelar o programa nuclear iraniano, enquanto o agora debilitado regime dos aiatolás tentava retaliar com lançamentos indiscriminados de mísseis e drones contra alvos militares e regiões urbanas de Israel. Mas foi outro conflito que gerou algumas das falas mais controversas do encontro, com dois líderes de perfis ideológicos diametralmente opostos convergindo em uma espécie de solidariedade ao valentão da vez, o ditador russo Vladimir Putin.
O brasileiro Lula esteve no Canadá na qualidade de convidado do G7, assim como mandatários de outras nações que não fazem parte do grupo, e emendou gafes. Desdenhou do convite para participar do evento ao dizer que “sou convidado desde 2003. Eu participo para não dizer que eu recuso a festa dos ricos”, e insultou o anfitrião, afirmando que o G7 não tinha necessidade de existir e que não passava de um grupo de “primos ricos que se reúnem”. Mas o pior, talvez, foi a defesa do retorno da Rússia ao grupo, que era G8 até Putin ser excluído devido à invasão e anexação da península da Crimeia, ocorrida em 2014. Lula, que mais uma vez “escapou” de um encontro com o ucraniano Volodymyr Zelensky, também convidado para a cúpula do G7, não esconde seu alinhamento com Putin, a ponto de ter sido um dos convidados de honra da festa de ditadores montada pelos russos para comemorar, em Moscou, os 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial na Europa.
Lula e Trump se uniram na defesa de um absurdo. Excluir a Rússia do G7 não foi um “erro”, pelo contrário: foi uma das pouquíssimas reações da comunidade internacional à anexação ilegal da Crimeia
O petista, no entanto, não esteve sozinho em sua defesa de Vladimir Putin. Seu comentário era uma resposta à pergunta de um jornalista sobre outra declaração similar, vinda do presidente norte-americano, Donald Trump. Na segunda-feira, ele havia dito que a exclusão da Rússia em 2014 havia sido “um grande erro”, e que se a Rússia tivesse permanecido no então G8 a invasão da Ucrânia, em 2022, não teria acontecido. Como se não bastasse, apesar da constante recusa russa em negociar um cessar-fogo, Trump ainda descartou a imposição de novas sanções à Rússia, afirmando que elas “custam muito dinheiro” – um contraste forte com sua postura em relação à Ucrânia, que foi alvo de várias decisões norte-americanas imediatamente após o vergonhoso episódio envolvendo Trump, seu vice J.D. Vance e Zelensky na Casa Branca, em fevereiro.
Lula e Trump se uniram na defesa de um absurdo. A exclusão da Rússia do G7 não foi um “erro”, pelo contrário: foi uma das pouquíssimas reações da comunidade internacional à primeira demonstração de imperialismo de Putin; de resto, o mundo ocidental simplesmente assistiu a tudo com uma boa dose de indiferença. Ao contrário do que afirma Trump, é mais plausível supor que, se àquela altura as potências ocidentais já tivessem demonstrado solidariedade incondicional à Ucrânia e rejeitado abertamente o expansionismo russo, talvez a invasão de 2022 não tivesse ocorrido.
A história dos últimos 100 anos demonstra de forma avassaladora que, embora seja impossível evitar períodos de instabilidade internacional, essa instabilidade é exacerbada quando agressores expansionistas e imperialistas são tolerados por muito tempo, em vez de serem freados logo após as primeiras mostras de seu potencial destrutivo. Quando Lula e Trump fazem a defesa da readmissão pura e simples da Rússia a um dos principais fóruns internacionais (a despeito do que Lula ache do G7), sem que ela demonstre estar disposta a se conduzir pelas regras do Direito Internacional, os dois presidentes estão apenas fazendo o jogo de Vladimir Putin. E isso é o exato oposto de trabalhar por uma paz sólida e duradoura no leste europeu e em todas as outras regiões marcadas pela presença de valentões, que estão apenas esperando a sua vez de atacar, de olho em como o resto do mundo seguirá tratando a Rússia.
Fonte: Por Gazeta do Povo